quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

12 - GABRIEL VIVE! * Malteses

Rio Guadiana, o pulo do lobo


 Malteses 
 (Memórias de antanho)


Uma mancha de arvoredo.
Treme o caminho de medo.

Um grito de raiva corta
o silêncio do montado.
Quem, na noite, mal suporta
o seu sossego assombrado?

Numa janela da aldeia,
tremeluz uma candeia.

Que sombra furtiva passa,
tragada p'la escuridão?
No silêncio de mordaça
pesa mais a solidão.

Andam malteses a monte
nas terras sem horizonte...

Soam secos estalidos
de facas de ponta e mola
e uns ténues ruídos
de passos que a lama atola...

Andam malteses a monte
nas terras sem horizonte...

Homens de pele trigueira,
curtida pelo relento,
aventuras de fronteira
e mulheres de momento...

Cicatrizes purpurinas
das balas das carabinas...

Nos beijos livres da noite,
bem ajustado o bornal,
há quem na sombra se acoite
maltês ou guarda fiscal!

O medo o medo guardando,
liberdade e contrabando...

Malteses matando a fome,
altivos como senhores!
Quem sois vós, homens sem nome,
 temidos p'los lavradores?

Quem impõe a lei da fome,
 muitas insónias consome!...

Quem vem lá, entre dois guardas,
a caminho da cadeia,
indefeso entre espingardas
que a lei da fome alardeia?

Um maltês acabrunhado
maldiz o dia azarado!...

Caiu um numa emboscada...
Outros em paz intranquila,
de noite, rondam a vila,
p'ra soltar o camarada...

Uma mancha de arvoredo...
Treme o caminho de medo!...



José-Augusto de Carvalho
Lisboa, 5 de Setembro de 1996.
Viana, 8 de Dezembro de 2010

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