Ontem, 11 de Outubro de 2014, no Salão Nobre da Junta de Freguesia de Aguiar, município de Viana do Alentejo, ocorreu o lançamento do livro «Pátria Transtagana», do qual sou autor, com prefácio do Coronel João Andrade da Silva e posfácio da Professora Maria do Céu Pires, Doutora em Filosofia pela Universidade de Évora.
Na mesa, da nossa esquerda para a direita: Rosa Barros, minha amiga e Professora de Filosofia do Ensino Secundário; Professora Doutora Maria do Céu Pires; Presidente da Junta de Freguesia de Aguiar; Coronel Andrade da Silva; e eu, José-Augusto de Carvalho.
Seguidamente, divulgo o texto da minha intervenção:
Boa tarde, Vila de Aguiar!
Boa tarde a todas as pessoas que puderam e quiseram vir assistir ao lançamento do livro «Pátria Transtagana»!
1.
Talvez eu esteja violando normas ao ser o primeiro a usar da palavra.
Evidentemente que muitas normas terão, como todos os ovos, o destino último de ser quebrados. Será este o caso? Quisera que sim.
Não é por inconsideração que me imponho na abertura desta sessão de lançamento do livro «Pátria Transtagana», mas sim porque é indispensável situar-me e situar este encontro.
Aguiar não é apenas uma das muitas localidades da Pátria Transtagana. É uma povoação que conheço desde menino. Aqui vinha com meu pai, num carro de varais, puxado por um possante muar. Mas esta razão que aduzo não poderia ser determinante para a minha preferência.
Determinante foi o convite que recebi, há meses, do Executivo da Junta de Freguesia de Aguiar para vir ler, neste mesmo salão, alguns textos dos muitos que ando escrevendo desde quase o amanhecer da minha existência de escriba impenitente, já lá vão quase setenta anos.
Portanto, Aguiar soube de mim como autor e honrou-me com um convite. Convite que aceitei agradecido.
Ora porque «Pátria Transtagana» reclamava o seu lançamento no Alentejo, como poderia eu, agora, ignorá-la ou preteri-la?
Como poderia eu não vir felicitá-la nesta data e associar à sua festa o lançamento deste meu livro?
Festa em que a vila de Aguiar comemora mais um aniversário da sua condição de Freguesia de Abril.
Eu sei que, por solicitações familiares e afectivas, outras povoações do nosso pátrio Alentejo poderiam reclamar-me o lançamento deste livro: Viana, onde eu nasci e onde nasceram muitos dos meus antepassados de apelido Carvalho; Serpa, onde nasceu minha mãe; Alcácer do Sal, onde nasceu minha avó materna Rosa de Jesus; Alvito, onde nasceram meus bisavós José António e Catarina das Dores; de novo Alvito, onde nasceu também minha bisavó Margarida.
Com excepção de meu avô materno, que desceu da transmontana Chaves buscando a sua moira encantada de sempre, a minha avó Rosa, toda a minha memória é transtagana.
2.
Quanto a mim, que poderei eu dizer?
Não tenho títulos nem cargos públicos ou privados e nem honrarias a recomendar-me.
A recomendar-me tenho apenas a minha condição de alentejano.
Também terei a recomendar-me um trajecto cívico de amor e respeito, de exaltação e defesa da Pátria Transtagana e das suas gentes, das minhas gentes.
Como vêem, nada de relevante há a dizer de mim, porque amar a nossa terra e a nossa gente é um apelo do mais recôndito de nós e não um dever ou uma qualidade racionalmente considerada.
3.
E no nosso caso de alentejanos, mais se imporá a nossa terra e a nossa gente, porque desde os recuados tempos do alvor da nacionalidade portuguesa que é a nossa, a Terra Transtagana e as suas gentes foram maltratadas, menorizadas, desprezadas, mortas ou expulsas.
Aquando da Reconquista, apeado o poder muçulmano, ninguém aqui mereceu a confiança dos reconquistadores. Ninguém!
Nada tenho contra outras gentes que queiram viver connosco nesta nossa terra e decidam ou não integrar-se no todo das nossas gentes; mas tenho tudo quando nos recusam o legítimo direito de mandarmos na nossa casa.
Urge a regionalização, única possibilidade de legitimamente, e sempre no quadro constitucional da Pátria Portuguesa, aspirarmos ao direito de escolher a nossa vida e o nosso destino.
Verdade é também que as gentes transtaganas não estão isentas de responsabilidade:
-- no passado, quando, algumas vezes tiveram voz e poder para tentarem impor-se, cederam a valores e interesses que lesaram os seus;
-- e no presente, quando, tendo voz e poder relativo para se impor, escolheram a resignação ou mal escolheram quem os represente na superior condução do seu destino colectivo.
Longe estive do nosso Alentejo; agora no nosso Alentejo estou, definitivamente, assim espero. Nunca procurei os favores dos poderes públicos e privados. Nunca os procurei e nunca os tive. E nunca os terei. E não é por teimosia, mas por opção.
E quanto a direitos, apenas tenho os direitos que a Lei Constitucional me confere.
4.
Sabem muito bem os mais velhos, como eu, o que foi viver, malviver, digo eu, sob o Estado Novo de Salazar e Marcelo Caetano.
Sabem os mais velhos, como eu, o que foi descobrir a Liberdade quando o Movimento dos Capitães nos devolveu a dignidade e a esperança numa Madrugada de Abril aureolada de cravos e de aromas de fraternidade e de paz.
Sabem os mais velhos, como eu, as dificuldades que logo surgiram, criadas pela resistência tenaz dos poderosos a quem não servia nem serve um povo adulto e livre.
Sabemos que esta terra e suas gentes lutaram desde a consolidação da independência de Portugal.
Estivemos sempre do lado certo da História e pagámos sempre o preço que nos foi exigido em bens, em sacrifícios, em sangue derramado.
No presente, resiste connosco a memória viva da Revolução dos Cravos e a vontade de transformarmos em realidade a sua promessa de finalmente haver e perdurar Abril em Portugal.
Aqui está, entre nós, um Capitão de Abril, um dos homens do Movimento das Forças Armadas que devolveu a todos nós a dignidade de mulheres e homens livres.
Um Capitão de Abril que conheceu palmo a palmo as terras transtaganas e as suas gentes.
Um capitão de Abril que nos ama e tudo arriscou por nós.
Um Capitão de Abril que está, também, nas páginas do livro que lançamos hoje.
Devemos-lhe tamanha distinção.
Bem-haja, Coronel Andrade da Silva!
E este bem-haja é extensivo aos seus camaradas de armas que nos ajudaram a entrever a esperança.
Com um segundo bem-haja relevo a Professora Maria do Céu Pires, Doutora em Filosofia, e gente da nossa gente, por ter aceitado ligar o seu nome e o seu amor ao Alentejo a este livro em lançamento.
E o meu terceiro bem-haja releva a querida Amiga Rosa Barros, professora de Filosofia do Ensino Secundário, uma filha dilecta dos Açores e já também alentejana do coração. Querida Amiga que empenhadamente me tem acompanhado neste meu percurso acidentado desde o meu regresso definitivo ao Alentejo.
5.
Na hora da gratidão, saúdo o Executivo da Junta de Freguesia de Aguiar pelo acolhimento e ao qual reitero a minha disponibilidade para colaborar em sessões culturais e cívicas, sempre que considerar oportuno e desde que para tanto eu esteja em condições de corresponder.
Nesta mesma hora da gratidão, saúdo também a gente da minha gente que está aqui e os familiares e Amigos naturais de outras regiões da Pátria Portuguesa que quiseram e puderam associar-se a este lançamento.
Finalmente, uma palavra de profundo pesar e de imperecível saudade para aqueles que partiram desta vida e exclusivamente por esse motivo não estão aqui também amparando o objectivo único deste livro: dignificar o Alentejo e por ele toda a Pátria Portuguesa.
Até sempre!