sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

34 - CLAVE DE SUL * Um dia, pela Primavera...




Era Maio, no Alentejo,
e madura, madura para a foice, a promessa do pão.


Eu completaria 17 anos de idade, em Julho.


Tu tinhas completado 26 anos, em Fevereiro.


Os meus olhos de adolescente já enxergavam o futuro sombrio que me esperava…


Os teus olhos de jovem mulher já viviam o futuro sombrio…
Morreste de morte matada porque pediste trabalho e pão.


Ai, Catarina, no Alentejo,
morria-se de morte matada porque se pedia trabalho e pão!


Ai, Catarina, no Alentejo,
era subversivo o pedido de trabalho e pão!


Ai, Catarina, no Alentejo,
era subversivo ser pobre e pedir trabalho e pão!



Ai, Catarina, no Alentejo,
havia pão nos celeiros,
havia pão para todos,
mas o pão não era de todos!...


Ai, Catarina, no Alentejo,
até era subversiva a partilha do pão anunciada pela boa-nova!


Ai, Catarina, no Alentejo,
quiseram o sacrifício do teu sangue, que não se transmutou em vinho!
Quiseram o sacrifício do teu corpo-vida, que não se transmutou em pão!


Ai, Catarina, no Alentejo,
as terras ensanguentadas insistem desesperadas em acreditar
nas utopias que sempre são matadas.


Ai, Catarina, no Alentejo,
haverá sempre um manto de papoilas, pela primavera,
gritando a simbologia do sangue derramado e duma terra ocupada.


Ai, Catarina, no Alentejo,
um dia, pela primavera… Quando? Quando?




José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 23 de Janeiro de 2015

domingo, 1 de fevereiro de 2015

14 - ESCAPARATE * O desaforo




Aos Autores antologiados não será solicitada nem oferecida nenhuma contrapartida para a participação na obra, não serão igualmente ofertados exemplares da mesma.


Todos sabemos que a escrita é anterior à actividade editorial.

Todos sabemos que a actividade editorial decorre da escrita ou, dito de outra maneira, sem autores não há editores.

Assente esta realidade que não oferece contestação, chega-me a surpresa absurda de uma editora convidar autores para colaboração numa amostragem de autores actuais, vulgo antologia, mas desde logo informando que esses mesmos autores não terão direito a receber um volume de oferta ou, mínimo dos mínimos, a um volume a custo reduzido.

Ocorre, assim, esta situação: a editora recebe a colaboração, edita-a, comercializa-a e os autores recebem o prazer de ver os seus trabalhos editados. Edificante!

Que imperativos legais impedem os autores de se associarem e combaterem este desaforo?

Até sempre!

José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 1 de Fevereiro de 2015.